domingo, 1 de junho de 2008

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA


Como efetivaremos apenas um relato sobre as relações históricas da Educação Física à
Educação Física Adaptada, estaremos apresentando aos que necessitam aprofundar e
aprimorar a leitura os seguintes autores: Marinho (1945, 1952, 1980), Oliveira (1983a,
1984), Medina (1983, 1987), Castellani Filho (1983, 1988, 1999), Tubino; Ferreira;
Capinussu (1984), Carmo (1985), Bracht (1986, 1989, 2000), Santin (1987, 1990),
Ghiraldelli Jr. (1988), Tani; Manoel; Kokubun, et al. (1988), Escobar (1990), Kunz (1991),
Tubino (1992), Soares; Taffarel; Escobar (1992), Soares (1996, 2001), entre outros.
Demarcado por uma origem militarista e higienista, de caráter fortemente biológico e
desportivo, o conjunto de estudos sobre o processo histórico da Educação Física no Brasil
tem forte influencia de Platão, que enfatizava e identificava a Educação Física como
treinamento físico, apresentando-a, simplesmente, sob a forma mecânica de execução ao
considerar que “a ginástica seria para o corpo e a música para a alma”, como constata
Santin (1987, p.23).
O pensamento que aqui se origina cultiva um corpo dicotômico, embora o homem não
possa agir por partes. O pensar, as emoções e os gestos são de natureza humana e não se
dissociam, sendo ora físico, ora psíquico, mas totais.
A formação militar e aristocrática foi sendo diferenciada na educação espartana, surgindo os
grandes jogos gregos, criados segundo Oliveira (1983a) em 776 a.C., sendo sustentado,
padrões de valores com um sensível desprezo pelos aspectos culturais.
Já na Educação Ateniense, a característica não era de caráter eminentemente militar, o povo
era amante da cultura e da prática esportiva como meio de formação do homem total.
Descreve Oliveira (1983a, p.25) que, “o modelo ateniense vem servir de paradigma para
todo o mundo grego, à exceção óbvia de Esparta”.
Ao final do século V, ocorre um crescente desinteresse pela prática da atividade física com
ideais humanistas em função de cisões. A educação preconizada nesse período valorizava
cada vez mais o intelecto, iniciando um processo de especialização prematura, contrariando,
segundo o autor citado, todos os objetivos educativos que durante séculos havia se
conservado.
Essa representação, de acordo com Castellani Filho (1988), pré-determinou e consolidou
alguns conceitos que se mantiveram historicamente entre os formadores profissionais na
Educação Física no Brasil.
Com o crescimento das cidades e a tendência na redução do espaço físico para lazer. As
pessoas passam a dar maior atenção à prática da Educação Física e às diferentes formas para
a execução dos exercícios físicos.
Em 1819, comenta Oliveira (1984), funda-se o primeiro Instituto de Ginástica para o
exército e para as escolas civis, e a ginástica, por influência de Rousseau, passa a ser
incluída entre os deveres da vida humana, tornando marcantes as atividades físicas com
espírito militar, e com a preocupação no desenvolvimento da força muscular.
Na tentativa de minimizar e organizar o caos em que se encontrava a educação brasileira,
em 1824, surge a primeira Constituição da fase Imperial. Nesse período, em função de lutas
por parte de profissionais que viam a Educação Física como elemento da Educação,
solicitam, segundo Oliveira (1983a), a inclusão da mesma nos currículos, surgindo alguns
escritos de livros, com a apresentação de conteúdos e modelos pedagógicos na tentativa de
aliviar o perfil “adestrador” da Educação Física deste período.
Os valores produzidos na educação do período industrial, segundo Romanelli (1984),
continham princípios de um povo forte, para uma nação forte, ou seja, relacionando a figura
de Homem pelo ordenamento do trabalho manual. Valores, considerados pela autora, como
fatores de obstáculos, principalmente educacionais.
Na década de 30, de acordo com os escritos de Castellani Filho (1988), a Educação Física
se consolida com uma identidade moral e cívica brasileira. Segundo o autor, esse fato foi
decorrente das instituições militares e da categoria médica nos princípios de Segurança
Nacional, com direcionamento ao adestramento físico para a defesa da Pátria que se
afigurava no sentido de manter a ordem político-econômica.
A Educação Física, a serviço do Estado, objetivava, segundo o autor, assegurar o processo
de industrialização implantado no País, cabendo a ela cuidar da recuperação e manutenção
da força de trabalho do homem brasileiro. Os trabalhadores se vêem direcionados para a
especialização profissional, tendo como resultado a permanência dos trabalhadores numa
mesma posição, durante longas horas. Constatamos, historicamente, que o modelo
apresentado, nesse período, para a Educação Física caracterizava-se pela atitude acrítica,
tanto da realidade interna, quanto das condições econômicas, sociais e culturais, tendo como
representação, profissionais que apoiavam seus paradigmas nos padrões de uma ideologia
da classe dominante.
A instrução física militar, ainda fortemente apregoada para o desenvolvimento da aptidão
física e de hábitos higiênicos colaborou e colabora, segundo Bracht (1992), para impedir a
reflexão teórica e prática, comentando que a desmilitarização ainda não se efetivou de fato,
tanto na Educação Física, quanto na sociedade, em geral, explanando que a reprodução se
encontra vigente e muito presente em nossas relações sociais, não conduzindo o professor a
ser sujeito do processo, ou seja, como aquele que participa.
A proposta, com perspectiva de ressignificar a Educação Física, desafiou, naquela
oportunidade, o processo de desenvolvimento do ser humano e que Gadotti (1981)
interpretou como embates em que duas forças contrárias de uma sociedade lutavam pelo
poder, mas considerando-a salutar se visualizarmos, segundo o autor, a ruptura de crenças e
convicções particulares para o reconhecimento do conjunto e da diversidade humana.
Os profissionais de Educação Física vivem, assim, dois momentos distintos e contraditórios;
o período a partir do movimento de 64, que levou os militares ao poder, apresentando um
governo ditatorial que sustentava a ordem social e política, e outro no final da década de 70,
ocasião em que começavam, segundo Santin (1990), surgir vozes que proclamavam a
necessidade da retomada da reflexão filosófica, sendo este, “[...]um momento de muita expectativa e de muita esperança na potencialidade da filosofia como força de revitalizar a
arte de pensar, como condição para recuperar a qualidade do ensino (p.67)”.
Para Medina (1983), procura-se deslocar a prioridade como produto para o processo de
ensino não-diretivo, com o objetivo para a promoção das relações interpessoais,
promovendo o incremento da criatividade, adaptação e modificação a novas formas de
movimentos. Esse momento foi, segundo Libâneo (1985), oportuno para que os
profissionais na área da Educação pudessem desenvolver diferentes atitudes que, até então,
não tinham sido apresentadas.
Mas, como a educação por si só, não leva a sociedade a se libertar da opressão, o ato de
conhecimento e conscientização, segundo Medina (1983, p.81), “[...] se constitui no
instrumento de superação das dificuldades mais vitais à sobrevivência, libertando e
liberando o homem para investidas mais efetivas na busca de sua identidade”. Os
professores de Educação Física, embora fazendo parte dos costumes, das classes sociais, da
política e de uma ética, na ocasião, procuram deslocar a prioridade como produto para o
processo de ensino não-diretivo com o objetivo de promover as relações interpessoais,
oportunizando a criatividade, adaptação e modificação a novas formas de movimentos.
Ao emergir a busca para o entendimento dessa totalidade, Bracht (1992) comenta que na
Educação Física desenvolve-se um movimento crítico, defendido por alguns como
revolucionário, identificando-a como tendência progressista, ocasião em que os
profissionais da área buscam uma autonomia pedagógica com um compromisso não
somente com a pesquisa em aprendizagem motora, em crescimento e desenvolvimento, e
em socialização, mas se detendo também, a um compromisso político para com os
oprimidos de nossa sociedade.
Ao definir a Educação Física revolucionária, Medina (1983, p.81) descreve-na como:
[...] a arte e a ciência do movimento humano que,
através de atividades específicas, auxiliam no
desenvolvimento integral dos seres humanos,
renovando-os e transformando-os no sentido de sua
auto-realização e em conformidade com a própria
realização de uma sociedade mais justa e livre.
Quando direcionamos o olhar para as diferentes concepções de Educação Física, na
produção científica, Bracht (1993) caracteriza pelo menos dois momentos: os escritos produzidos na década de 80, fazendo menção às obras de Tubino (1984), Faria Jr. (1987),
Canfield (1988) que continham tendências ao crescimento e desenvolvimento motor,
constatando uma abordagem desenvolvimentista com embasamento na teoria da psicologia
do desenvolvimento e da aprendizagem, ressaltando a ausência de uma discussão
epistemológica.
Nessa época, constatada por Soares (1996, p.9), também ocorre o período denominado de
psicomotricidade, ou educação psicomotora. A Educação Física passa a envolver-se com as
tarefas da escola como mero meio para aprender Matemática, Língua Portuguesa, História,
entre outras, e um meio para a socialização, não tendo segundo a autora, um conteúdo
próprio.
Outra representatividade nessa ocasião, segundo Bracht (1999), foi o predomínio do
conhecimento das Ciências Naturais, principalmente da Biologia como conhecimento
fundamentador da Educação Física, também significando a ausência da reflexão
pedagógica. Essa etapa foi denominada pelo autor de movimento renovador da Educação
física brasileira.
O segundo momento assinalado por Bracht (1993), por meio da produção científica, foi o
início dos anos 90, período em que os estudos buscavam identificar as matrizes teóricas
metodológicas, ou seja, as concepções de ciência. O autor apresenta alguns registros como
de Silva e Faria Jr., mencionando que os mesmos procuravam ampliar as análises do
processo em construção.
Sob essa ótica, constitui-se um movimento denominado como revolucionário também
convencionado de crítico e progressista que, conforme comenta Bracht (1999), é bastante
homogêneo, sendo possível, hoje, identificar um conjunto de propostas diferentes e
importantes.
Outra tendência apresentada ao longo do processo em busca da transformação, tem como
fundamentação a promoção da saúde, proposta que revitaliza a idéia de que a Educação
Física é a educação para a saúde, ou para a promoção da saúde.
Diferentemente, estrutura-se a Pedagogia histórico-crítica, que o autor citado intitula como
crítico-superadora com o conhecimento direcionado para a cultura corporal nos seus diferentes temas como “o esporte, a ginástica, o jogo, as lutas, a dança e a mímica. Na
pedagogia histórico-crítica sistematiza-se o conhecimento da Educação Física em ciclos”
(BRACHT, 1999, p.80).
Outra concepção identificada por estudiosos da área para esse período transformador
denomina-se de crítico-emancipatória, tendo as primeiras elaborações com a forte influência
da pedagogia de Paulo Freire. Outra constatação apresentada é a fenomenológica, tendo o
movimento humano como base, em parte, em Merleau-Ponty; uma outra é designada de
dialógica, onde o movimentar-se humano é entendido como uma forma de comunicação
com o mundo, a noção de sujeito é percebida numa perspectiva iluminista capaz de crítica e
de atuação autônomas, apontando para os elementos da cultura do movimento, de forma a
desenvolver nos alunos a capacidade de analisar e agir criticamente.
Para Bracht (1999, p.81), essas são algumas das diferentes propostas apresentadas como
alternativas aos paradigmas dominantes, e que para as teorias progressistas (pedagogia
crítico-superadora e crítico-emancipatória), são “as formas culturais dominantes do
movimentar-se humano que reproduzem os valores e princípios da sociedade capitalista
industrial moderna”.
Vale destacar que os momentos apresentados estão contextualizados em momentos sociais
diferentes. O que consideramos relevante nesse processo é a possibilidade de relacionarmos
as várias correntes para uma reflexão sobre como os elementos das mesmas podem
construir a formação profissional.
Buscarmos novos caminhos implica assumirmos um papel que redimensiona não apenas as
probabilidades, mas as possibilidades da Educação Física. Uma Educação Física com
problemas sim, mas principalmente, com soluções que garantam a visão de homem e que
apresente identidade crítica compromissada com o indivíduo e a sociedade.
Mesmo não sendo muitos os profissionais que se posicionam à luz dessa tendência
emergente, lembra Castellani Filho (1988) que os povos carregam consigo a certeza de que
as atividades corporais devem se configurar como instâncias onde o Homem aprenda a
construir uma sociedade mais justa, com capacidade para transformar o tempo em que
vivem.
Consideramos que essas tendências têm seus méritos, pois, buscam romper com o
paradigma da aptidão física na perspectiva de transformação. E, enriquecidos por essa
historicidade estaremos, na seqüência, efetuando algumas correlações com a formação
universitária na Educação Física Adaptada.

FONTE:
SONIA MARIA TOYOSHIMA LIMA
EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA: proposta de ação metodológica
para formação universitária
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA
CAMPINAS – SP
2005


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